Regresso a São Tomé: Pelo Norte da ilha

Acho que foi uma coisa que aprendi com os anos: o bom de acordar cedo.
E em viagem então adoro. E então quando estou mesmo à beira-mar e posso acordar, vestir o bikini, sair do quarto, caminhar descalça pela areia até ao mar e dar um mergulho… então é o paraíso.

 

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E hoje estive no paraíso. Logo pelas sete da manhã, quando me deixei ficar a flutuar nas águas calmas da baía do Makaira. A ouvir os sons, a absorver os cheiros, a água morna, os movimentos leves. Tudo tão calmo, tão pacífico. Num mundo perfeito seriam sempre assim os amanheceres.
Num mundo perfeito, a seguir tomaria um duche reconfortante e tomaria um pequeno almoço maravilhoso a olhar para o mar. Fruta fresca, ovos mexidos, pão quentinho, sumo natural, café acabado de fazer. Isso seria num mundo perfeito e hoje o meu mundo foi perfeito.

 

 

Mas de repente lá fomos acordados do nosso doce torpor e ala que se faz tarde que o avião vai partir e chegou a hora de regressar a São Tomé.
Meia hora de voo e estamos de volta à terra que tão bem nos recebeu.
Desta vez, a ideia é conhecer o Norte e o Oeste da ilha. Carro alugado e lá partimos novamente pelas estradas sinuosas da ilha. A primeira paragem é na Roça da Boa Entrada onde chegamos já perto das 12h00. Hora perfeita, o turno da manhã acabou as aulas e as ruas estão pejadas de miudagem nos seus uniformes escolares.

 

 

São giros a valer estes miúdos. Saltam e pulam à nossa volta, pedem um doce, ou uma selfie mas não são chatos. Se dizemos que não, não insistem, mas adoram tirar fotos e riem-se imenso ao verem- se depois nos pequenos ecrãs digitais.

 

 

À volta a vida continua, meninas de 5 ou 6 anos  carregam bebés às costas e alguidares de loica lavada, mulheres lavam roupa, homens observam o que se passa  sentados indolentes pelas soleiras.

 

 

Vamos embora como chegamos e a vida continua exactamente igual. E assim continuará….
Perto, encontramos uma das roças mais emblemáticas da ilha, a Agostinho Neto, enorme, com aquele que em tempos foi um hospital, no topo de uma alameda, majestoso. O edifício como todos, hoje em dia, está uma ruína, mete dó. À volta vê-se uma imensidão de casas, armazéns, igreja, o que resta do que terá sido uma grande exploração agrícola.

 

 

 

Compramos uma cerveja numa barraca, à porta num fogareiro improvisado grelham búzios. Os miúdos para variar saltitam à nossa volta.

 

 

Pergunto-lhes o nome, o que querem ser quando forem grandes. Carla, 14 anos,  quer ser “modela”. Kate, 12 anos, quer ser “actora”. Corrijo-lhes o português, mas incentivo lhes os sonhos.
Não deve ser fácil viver quando se nasceu numa roça em São Tomé, mas ninguém disse que também tinha que ser difícil sonhar.

 

 

Despedimo-nos rumo a Guadalupe onde descobrimos o restaurante Celvas, da Celeste e do Vasco, um casal São Tomense emigrado em Portugal há 30 anos que resolveu voltar à sua terra para abrir um restaurante a preceito. Toalhas e guardanapos de pano, talheres de peixe e de carne, copo de vinho branco, tinto e água.

 

 

Também organizam  casamentos e baptizados mas nos dias normais, recebem quem passa e servem comida boa, da terra. De entrada, ovas, bolinhos de peixe e de fruta pão, banana laminada fina e frita.

 

 

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Pedimos peixe grelhado, vem barracuda e peixe fumo, legumes, batata doce, tudo muito bom. Celeste acompanha-nos com a sua conversa: como gosta de Portugal, como São Tomé já é uma pasmaceira, os filhos que ficaram por Loures, o negócio que não vai bem. “Ninguém tem dinheiro para comer fora, este país tem pouca gente e a maioria são crianças”, afirma, já sem sotaque algum da terra. “Na minha vida inteira já vivi mais anos em Portugal do que aqui”.

 

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Despedimo-nos com votos de felicidades, para o negócio e para o regresso a Portugal, que o nosso está para mais breve do que desejaríamos.
Estrada fora, a paragem seguinte ao almoço é na Praia das Conchas, uma pequena praia sem areia, com pedrinhas e canoas, onde conhecemos Neiza.

 

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Neiza, 72 anos, cega de um olho e com 10 por cento de visão no outro, 10 filhos, tantos netos que já lhes perdeu as contas. E uma bisneta que carrega no colo com orgulho. “Toda a minha vida foi trabalho, vim de Cabo Verde com 20 anos para trabalhar nas roças. Marido morreu, sempre trabalhei para dar de comer aos meus filhos. Agora cuidam eles de mim. E eu trato desta pequena. Não vejo nada, mas tenho olhos para ela.” “E a senhora, quantos filhos tem?” pergunta-me. “Eu? Eu tenho uma…” “Uma? Só uma?” Neiza ri se à gargalhada sem querer acreditar. “Isso é como não ter nenhuma”.

Riu-me, despeço-me com um desejo de felicidades para bisavó e bisneta.

Poucos metros à frente, nova paragem, agora na Lagoa Azul, uma baía linda, cheia de embondeiros e com uma côr de água incrível. Aproveitamos para dar um mergulho e  refrescarmo-nos do calor que é mais que muito aqui pelo Norte.

 

 

Entramos no carro e fazemo-nos à estrada ainda a pingar. Daqui seguiremos pela costa fora até ao lodge onde vamos pernoitar, logo a seguir à povoação de Neves.
A estrada é linda, mesmo à beira mar, vemos miúdos a pescar, outros a mergulharem de pontões, aqui não há areia, mas pedra, preta, o mar é entre o azul e o verde, muito límpido.

 

 

Passamos por Neves sem parar, à primeira vista não tem qualquer tipo de interesse, muitas casebres,  ruas de terra batida, miséria à vista.

 

 

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Um quilómetro mais e chegamos ao lodge, meia dúzia de cabanihnas à beira de uma falésia. Lá em baixo uma praia linda. Hoje é por aqui que ficamos… amanhã há mais…

 

 

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