Marrocos: 2º dia – Meknes

E o segundo dia não foi, digamos, um dia fácil….

Ao contrário do que fazemos cá pelo burgo, a “Páscoa muçulmana”, ou melhor, a Festa do Sacrifício que é como se chama, acabou por ser um grande sacrifício mas para nós, sem amêndoas, nem folares mas com pilhas e pilhas de cordeiros mortos pelas ruas, rios de sangue e um cheiro nauseabundo pelo ar.

Mas começando pelo início, o segundo dia em Marrocos começou cedo, as estradas não são propriamente as nossas auto -estradas por isso qualquer viagem demora muitoooooo tempo. De Chefchaouen a Meknés são 200 km que demoram cerca de 4 horas a percorrer.
A paisagem é bonita, com muitos montes, vales, oliveiras e vinhas a perder de vista. Aliás a zona de Meknés e a capital do vinho e do azeite de Marrocos.
Marrocos apesar de ser um país onde o consumo de álcool é (praticamente) proibido – principalmente dentro das medinas e junto às mesquitas- , é um grande produtor de vinho. Até o actor Gerard Depardieu  tem umas vinhas aqui pela terra.
Chegados a Meknés e nada preparados para o que nos esperava, o espectáculo era de puro terror para quem como nós não está habituado a ver milhares e milhares de animais – neste caso cordeiros – a serem mortos, esventrados e assados pelas praças, pracinhas e ruelas. Crianças a brincar com orelhas e patas de animais, a exibirem os cornos como troféus, a jogarem à bola com cabeças carbonizadas. Um espectáculo puramente dantesco para quem como eu está mais habituado a festejar feriados religiosos com amêndoas e filhoses. Pelo ar um cheiro denso a carne assada e uma nuvem de fumo que arranhava a garganta e inflamava os olhos. Tenho espírito aberto e bastante ecuménico, mas lá que calhámos no sítio errado no dia errado, disso não me restam dúvidas.

Para complicar ainda mais, o Riad Amazigh, que tinhamos reservado, fica mesmo no meio das ruelas da Medina  o que dificultou em muito a tarefa de encontrá-lo. Enquanto alguns ficaram na carrinha, outros foram pela encruzilhada de ruas em busca do riad, com a ajuda de um menina local, a Su, nosso anjo da guarda, que se prontificou em nos orientar.
Até ao riad, a pé, o caminho não foi fácil, as ruas estreitas, os bidões a deitarem labaredas, as pilhas de carcaças e peles, os riachos de sangue.
Chegados e recebidos pela Fathma, nascida marroquina, mas criada em França, lá conseguimos finalmente relaxar um bocadinho.
O Riad Amazigh é muito giro, em tons de azul e branco, com quartos bem decorados em estilo local e um terraço fabuloso no último piso, com vista sobre a cidade.
Simpática, Fathma prontificou se para nos fazer o jantar nessa noite, já que devido à festa seria bastante complicado arranjar algum sítio aberto.

Livres das malas, cansados e enjoados com o cheiro da carne, lá ganhamos coragem para nos aventurarmos pelas ruas da cidade, a desviar os olhos dos restos mortais dos animais e a tentar não pisar nada menos próprio.
Chegados à praça principal e  visto já passar das 4 da tarde, resolvemos comer qualquer coisa no único sítio que encontrámos aberto, o Pavillion dês Idrissides, um terraço com vista para a praça e para o Bab El Mansour, porta monumental da cidade imperial, construída em 1732. É uma das mais belas obras do sultão Moulay Ismail, considerada a porta mais imponente de Marrocos, senão mesmo do Norte de África.

Para almoçar resolvemos experimentar a “pastilla”,  um pastel de massa fina, recheado de pombo ou frango temperado comespeciarias e polvilhado de canela e açúcar. Qualquer coisa que nos pareceu um pastel de nata recheado de carne desfiada, uma mistura enjoativa que não convenceu ninguém. Ou melhor que nos convenceu a todos a nunca mais comer tal coisa.

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Para fazer a digestão de tal almoço e algo desalentados, decidimos alugar duas charretes e ir dar uma volta pela cidade. As charretes de Meknés são qualquer coisa de surreal, parecem ser o refugo de um filme da Disney, umas são da Bela Adormecida, outras da Gata Borralheira – a minha era prateada em formato de abóbora – já todas muito velhotas e a serem puxadas por umas pilecas.

Uma hora de passeio, com direito a visita às cavalariças reais – que em tempos albergaram 12 mil cavalos – ficou por 12 euros para 4 pessoas. E vale a pena. Foi o melhor que fizémos para tentar apagar a imagem dos carneiros e o sabor da “pastilla”.
No fim, parámos na praça central que a partir do final da tarde começa a ficar cheia de gente, de bancas de vendedores, de famílias a passear, de pedintes, de homens com cobras para os turistas tirarem fotos, etc…

Voltámos para o riad já noite e rumámos ao terraço onde foi servido o jantar. E era mesmo um jantar assim que estávamos a precisar, bendita Fathma. Começámos novamente com uma sopa harira e seguimos para uma tajide de frango com azeitonas e limão confitado. O molho era simplesmente maravilhoso.

Entre conversas e brindes, ainda conseguimos terminar o dia com algumas gargalhadas. Sob as estrelas.
Uma óptima forma de acabar um dia menos bom…

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